A cidade nunca mais será a mesma

Tá bom, a gente brincou, fez piada, mas com certeza nossa vida mudou a partir daquela segunda-feira, 15 de maio. Impossível achar que tudo continua do mesmo jeito. Nem a gente, nem Sampa. Talvez o tempo faça voltar a "normalidade", mas agora não.
Sempre me senti segura em Sampa, muito mais do que em Porto Alegre. Ontem mesmo alguém de lá perguntou isso. Ainda acho. PCCs têm em todos os lugares. Se morasse aqui ou em outra cidade do país, poderia passar por isso. Mas nunca imaginei passar. E as imagens daquela segunda-feira vão ficar por um bom tempo. Brinquei com a história de Londres. Mas foi dantesco. Sai de casa na manhã de segunda na boa. Nunca imaginei que, em questão de horas, a cidade se tranformaria naquele horror. Peguei o metrô, porque estava atrasada, e pensei: se fosse terrorista, atacaria aqui ou na Paulista.
Quando cheguei no trabalho, que fica numa repartição pública, vi que o medo estava instalado. Pra entrar, tinha de dar nome e andar. Na frente do prédio, do outro lado da rua, a avenida interditada porque fica um posto da guarda metropolitana. Mas foi na hora do almoço que a coisa pegou. Na rua, onde havia guarda, a população fugia. Não queria ser metralhada, ou morrer por engano, sei lá. A rua do meu trabalho tinha blitz. Pra entrar na Paulista, os motoqueiros eram revistados e os carros suspeitos também. Por sinal, motoqueiro aqui virou sinônimo de ladrão. Na volta, uma mulher chorava porque tinha de buscar a filha urgente no colégio. Pais e mães ligando. Celulares congestionados. E, a medida que a tarde chegava, o pânico se instalava. Toque de recolher. Lojas fechando, boatos. Sai às 17 e o comércio estava quase todo fechado. A cidade parada. Os carros buzinando, trancando todas as ruas. As pessoas apressadas. Gente correndo, correndo mesmo, para ir pra casa. E um mega congestionamento nunca visto.
Mas o que mais me marcou foi a sirene dos camburões. Acordei e dormi com isso. Um inferno!!!

Agora, a polícia continua na rua e a população ainda um pouco assustada. Gente, principalmente motoqueiro, ainda é revistada. Chega a ser desumano o tratamento dos PMs.

E a gente? Bem, eu fico com a sirene ainda soando. Porque ela continua em todo o momento. Até quando vamos ficar assustados, não sei. Mas o certo é que logo logo a polícia sai das ruas. Até a próxima rebelião ou atentado do PCC. Um absurdo.

Apesar disso, ainda me sinto mais segura do que em Porto Alegre.

O engraçado disso tudo, apesar do trauma, foi o humor do povo pra nossa situação:

"É o movimento techno-beat-pós-moderno-remix, fazendo uma semana de 'artes' e revisitando o conceito de Paulicéia Desvairada..."

"Vendo colete a prova de balas"

"Pensei que estivesse em Sampa, não no Rio"

Comentários

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Bom, acho que pelas pouquíssimas piadas que rolaram (quase nenhuma, na verdade) as pessoas entenderam que foi realmente grave. Não é uma questão de se sentir segura aqui ou lá, mas de perceber o quanto estamos vulneráveis. Hoje conversávamos que daqui a pouco começa um movimento como o da máfia italiana - ataques a todos os poderes, Legislativo, Judiciário e Executivo. É muito grave. E não é um problema localizado. Deve ter sido barra ter que sair de casa.
Agora, sobre a piadinha do Rio: não existe um clima de guerra permanente na cidade. Imagina se Bagdá fosse apenas o que nós vemos na tevê? Não é. E o Rio não é apenas pé de morro, como passa na tevê.
Anônimo disse…
Sempre penso que um dos melhores aspectos da nossa natureza humana é a capacidade de rirmos de nossas próprias desgraças. Tipo quando caímos no chão, diante de todo mundo... A melhor alternativa é rir também. Óbvio que não se compara com a guerra urbana e o caos institucional que rondam nossas vidas, mas também acho muito legal que o que nos trouxe, como espécie, até aqui, foi a capacidade de adaptação. A gente se adapta ao que vier, seja por meio da resistência ou da resignação (espero que pela primeira via, e de modo pacífico). Filosofia Tim Maia: Polícia é polícia e bandido é bandido. Só fica diferente na nossa brincadeira de criança. Na 'vida real', não tem glamour e dói, mesmo quando não somos as vítimas diretas.

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