Trampolim



Palavras não bastam, não dá para entender. E esse medo que cresce, não para.
Assim começa "A noite", da Tiê.

O medo de amar parece ser o mal do século. Amores líquidos, já dizia Bauman.

Em viagem, conheci uma mulher - coincidentemente gaúcha e ex-jornalista. Ela viajava sozinha, eu também. Reclamou do assédio que sofreu, por estar só. Reclamou do machismo. E eis que, lá pelas tantas, comentou: o fato é que, mulheres como nós, assustam. Por isso estaria sem um namorado atualmente.

Lembrei-me da viagem ao Pará, quando um cidadão perguntou o que fazia uma mulher sozinha lá... como se eu não tivesse o direito de estar só. Estava com uma amiga. Não estava só. Mas ele queria que eu estivesse com um macho. Alfa. E, como não estava, achava que podia abusar, se insinuar, de modo agressivo.

Mulheres sós chamam a atenção. Para o bem e para o mal. É como se, por um lado, alguns lessem: está disponível; e outros: ela se basta.

Bastar-se. Somos seres sós, que vivem em coletividade. Não devemos depender de outros para sermos felizes. Não precisamos, necessariamente, estar com alguém. Mas a vida fica bem mais colorida quando podemos dividir dores e amores.

Mas, sim, assustamos... A sensação que tenho é que há um descompasso entre os homens e as mulheres da nossa geração. Fomos criadas para sermos livres, independentes. E eles foram criados para terem a seus lados as Amélias.

Entre palavras não ditas... diz Tiê. Outro dia ouvi de uma pessoa que, quando estava comigo, era imaturo. E aí, falou a palavrinha mágica: medo. Não acreditou em mim... no que poderíamos ser. E, agora, "mais maduro", está com outra. Eu respondi: trampolim.

Às vezes tenho essa sensação, de que algumas pessoas me veem como uma fortaleza, a que vai arrumar a casa... quando a casa está arrumada, buscam a Amélia. Porque o macho Alfa tem de ter a seu lado a Amélia. Outra é impossível, é assustadora. Ele só é Alfa porque ela é Amélia.

Hoje um amigo publicou no Facebook as palavras de Xico Sá, em seu novo livro: Os machões dançaram - crônicas de amor e sexo em tempos de homens vacilões". Xico Sá diz: Como pode existir um homem com tantas convicções inegociáveis, com tanto arrojo e determinação em uma era de tantas incertezas? Há uma arrogância de quinta no macho alfa. Desconfio de tal criatura e de sua leonina juba.
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