(IN)sone

Eu olho para o teto branco e vejo uma imensidão. Ele parece o buraco negro e, quanto mais eu entro, mais me perco. Ele me lembra os sonhos não vividos. E me desperta.
Toda vez que eu fecho aquela porta, ela me lembra do que não foi. E isso me desperta.
As caixas empilhadas na sala - resquícios da última mudança - me sinalizam a temporalidade da vida. Tudo pode ser empacotado de uma hora para outra. Ou desempacotado. Elas também me despertam.
Caminho pela casa e as paredes gritam. Eu nunca sei se será uma noite tranquila. A vida lá fora insiste em entrar. E levo comigo tudo o que me desperta.
Não existe relógio algum na casa mas é só eu apagar a luz que ele começa a correr, num tic-tac acelerado, como a dizer da urgência da vida não vivida.
Eu olho para o teto branco e vejo um céu estrelado. Procuro teu rosto no meio da constelação. Ele aparece fraco. Eu vejo a estrela cadente e tento alcança-la. Mas ela me escapa.
Minha mão desliza. Para. Pergunto-me: cadê? Não veio. A mão segue a carícia. Ouve a voz da solidão. Ela não responde porque.
O coração palpita no peito, muito maior do que ele é. Ele salta aos olhos de quem tem o dom de enxergar. E dói. E porque está assim, tão grande, tão inchado, ele lembra do passado que não existia naquele agora. Do presente que pode nunca acontecer.
Eu fecho os olhos. Não quero contar carneirinhos. O corpo dói. O mundo lá fora não o deixa relaxar. Eu fecho os olhos, mas eles te enxergam. Então eu abro os olhos. Tudo me desperta.
O vento uiva lá fora. É sinal de que vai chover. Eu vejo o clarão dos relâmpagos. O coração acelera. O relógio que não existe na parede faz tic-tac. Os cachorros latem. O mundo gira. Todos estão a me dizer que o tempo corre. E que falta pouco.
Eu tenho medo de me jogar no abismo e do outro lado a tua mão não estar pra me segurar. Ela sempre esteve lá. 

Comentários

Postagens mais visitadas