Pequena diante da tua paralisia



Mais uma vez eu me deparo com essa dor no peito. E o vazio que não acalma, só cresce.
Os olhos já não enxergam porque as lágrimas teimam em escorrer pelo meu rosto. E eu queria um abrigo. O teu peito amigo. Queria senti-lo sem a sensação de choro e incerteza que ele transmitia nos últimos dias. Queria que ele pudesse me acolher, tanto quanto eu o fiz. E que ele sentisse a minha falta, como eu sinto. Talvez eu quisesse que fossemos iguais no sentimento, mas somos diferentes.
Queria que para ti fosse tão importante quanto para mim. E que não tivesses medo de me amar. Mas o meu desejo é pequeno diante da tua paralisia.
Os meus olhos não enxergam mais porque as lágrimas insistem em cair. E eu vejo apenas o passado, que insiste em bater à porta (da memória). Vejo a vida que vivemos juntos. E dói.
Os meus olhos não enxergam. O futuro desejado. Porque ele era pequeno diante da tua paralisia.
Eu vejo apenas o passado. E também dói. Dói lembrar nossos primeiros dias. E os últimos. E os do meio. As indas e vindas. Lembrar que fiquei sozinha. Desejando sozinha. Querendo sozinha. Insistindo sozinha. Em uma vida a dois. Mas ela só existe quando os dois querem, os dois desejam, os dois insistem.
E eu fiquei sozinha com a minha dor. Sozinha diante da tua paralisia. Pequena. E hoje, não sei o que fazer com a dor no peito. Nem com a vida que não vivemos. Grande para a tua paralisia.
Fiquei parada, diante da tua paralisia. E agora, ainda parada, eu penso que, se soubesse que aquele era o nosso último dia, teria aproveitado um pouco mais. Se eu soubesse ... Mas não sei. Tenho de aprender um pouco de tudo, inclusive a viver sem ti.
Se soubesse que te ver jogar era o meu presente de despedida, talvez eu não o quisesse. Porque para mim era importante estar contigo, sempre, mas o teu medo não permitiu. Enquanto te via jogar, sentia em cada gol uma dor. Porque aquela bola te levava para longe de mim. Naquele momento eu sabia que, mais uma vez, eu estava contigo para algo que para ti era importante. Mais uma vez só eu.
Agora eu olho para a janela e não enxergo. As lágrimas turvam a minha visão. E, pela primeira vez, eu vou embora sem que te despeças de mim. Porque não houve adeus. Porque tudo ficou tão grande diante do que eu sentia...

(Ela pensa que é literatura)
(Entre Sampa e Porto Alegre – avião)
21 de dezembro/07

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