Presentes da vida


Tu foste um presente em minha vida que, em dias como os de hoje, eu sinto falta. Dias de chuva como o do nosso reencontro. Um presente dado e retirado. Que custamos a entender por que. E que mesmo entendendo, não queríamos aceitar, e tentamos retroceder. Mas o tempo não volta. A magia de ontem não se repete hoje.
Tu foste um presente em minha vida que há um ano me foi oferecido de novo. Talvez como migalhas de presente. Restos abandonados...
Tu foste a década perdida que insiste em ser lembrada. O olho brilhante que eu nunca mais vi. E que persigo em outros olhares. Tu foste o que eu sempre quis e que custei a achar. Mas era idealizado demais. Não cabias nos meus sonhos. E hoje, um ano depois do nosso idílio de quase verão, eu lembro das nossas vidas juntas. E sinto falta. Sinto falta da tua mão percorrendo o meu corpo. Quente e curiosa. Tu pegas como quem agarra algo muito gostoso, que não quer perder. Talvez porque o meu corpo se sinta sem sentido... Por isso eu sinto falta.
Tu foste aquele que me fez completa. Em um porto seguro. Que temperava a minha vida sem sal. Que hoje está regada de mar e repleta de doce.
Tu foste a minha criança. Que paradoxo! Não havia diferenças entre a gente. Éramos duas crianças brincando. Sem hora. É disso que eu sinto falta. Talvez esse fosse o maior presente: a oportunidade da vida, apenas. Sem passado, nem futuro. Somente o presente que se apresenta. Por isso, tu foste o meu presente. És no meu futuro o meu passado.
Tu foste. E hoje, no presente, o que eu queria, era um abraço teu. O teu aconchego a acalmar o meu coração aos pulos, com medo da perda. Queria que me confortasses e me dissestes que não é preciso temer. E que mostrasses ao meu corpo sem sentido como é sentir.
Tu foste o meu presente. Assim como outros que ganhei na vida. O presente do último verão, da lua cheia, da Vênus alinhada. Mais um presente que a vida me deu. Tu também és um presente. Tu és presente. A cada hora, minuto e, mesmo assim, eu sinto falta. Como se o tempo não fosse suficiente. A vida fosse pequena demais para nós dois, pequenos. Nós, sim, crianças. Tu és a minha criança, que faz biquinho. E solta um sorriso maroto. E que eu quero aconchegar, como um dia fui aconchegada. Que protejo e não quero me desgrudar. E mesmo assim eu sinto falta.
Tu és o meu presente. Mas a falta é tanta que parece passado. O que me falta? O presente passado? O futuro presente? Não sei. Só sei que chegaste para acalmar o meu coração, mas que o deixa aos pulos! Ciumento...
Tu és o meu presente. E contigo eu dou risada. Do teu jeito bobo de ser. Do sotaque indefectível. Das gírias próprias e das em comum.
Tu és o meu presente e assim, me fazes feliz. Mas eu sinto falta... de ti, o tempo todo. Da tua pele morena e quente, contrastando com a minha. Da lua cheia que aqueceu nossos corações. Da magia do encantamento, que hoje se transformou em calmaria.
Tu és o meu presente. Mas o meu corpo sem sentido não consegue segurá-lo e teme perde-lo. O meu corpo sem sentido precisa do teu toque. Precisa ficar agarrado ao teu até voltar. Precisa não sentir a tua falta, apenas a tua presença. Tu és o meu presente. E é nisso que eu me agarro. Mas por vezes ele parece me escapar pelas mãos... e eu tenho medo de quebrá-lo.
Tu és o meu presente. Mas o meu corpo está sem sentido, congelado no tempo. À espera de um presente para recobrá-lo. E tu és o meu presente... Tu és! Tu és o presente que eu espero para o meu corpo sem sentido voltar a sentir. Em dias de lua cheia, como o meu coração, ou minguante, como o meu corpo. Nova ou crescente. Não importa. Se tu és o meu presente, em dias como hoje, és tu quem pode me tocar. Tu e mais ninguém. Porque tu és o meu presente que não quero passado. Tu és o meu presente futuro.
Tu foste o meu presente, que me guiaste por estas ruas. Um presente agradecido. E hoje sou eu quem conduzo. Ou o meu presente. Somos nós. Pela primeira vez. Caminhos que um dia foram teus, hoje são nossos. Guiados pela lua cheia alinhada à Vênus. Nós somos presente. À procura do sentido. Presente em algum lugar do passado.

Nov/07
Sampa

Comentários

Anônimo disse…
Lindo texto...
LIndoooo

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