Presença

Sonhei contigo. De novo. É a terceira ou quarta noite seguida que sonho contigo. Tens sido, desde a aquela vivência, presença constante em minha vida. Não sei porque. E estou tentando entender. Vieste-me como lembrança, naquele dia. Primeiro a imagem de Brasília. Depois, tu. 
Não consigo lembrar direito dos sonhos. Vou começar a dormir com um caderno ao lado, para anotá-los e tentar compreendê-los. 
Esta noite, como nas outras, estávamos felizes. Não havia mágoa, rancor, nada. É como se tivéssemos esquecido o mal que nos fizemos (ou que tu fizeste?). Como se fosse um tempo anterior... ou quem sabe, bem posterior. 
Há cerca de três anos nos encontramos. E a minha vontade era seguir atrás de ti. Deixar tudo. Para que fazer Mestrado, se o mais importante era estar ao teu lado? Mas tu não me deste um sinal de que querias ou aceitarias que eu fizesse isso. E, então, fui para a Bahia. Como um exílio. Assim como fui para Pelotas. Bem sabes que muitas das minhas decisões têm relação contigo. Quando não posso estar ao teu lado, me vou... E fui, e assim tem sido, há tantos anos... Indo, indo, indo, indo... e nunca vivendo o que os sonhos têm mostrado. 


O sonho passado tinha muitas partes. Parece que eu ia a um espetáculo de dança. Em Brasília? Ou será que esse foi o sonho do outro dia? Bem, o que para mim é nítido, é que dançávamos! Sim, dançávamos! Depois de muito ir ou não ir ao teu encontro, lá pelas tantas, fui contigo a um jantar (seria do PT?) e quando me vi, estávamos frente a frente, abraçados. E tu começavas a me conduzir e dizias: nunca dançamos juntos. Era uma cena tão linda, nós dois, felizes, talvez como pouca vezes estivemos. 
Fiquei pensando em uma frase de Carta a D., que te presenteei. "Preciso reconstruir a história do nosso amor para apreender todo o seu significado. Ela foi o que permitiu que nos tornássemos o que somos; um pelo outro, um para o outro". (GORZ, 2012, p. 6). Os sonhos são isso, uma reconstrução para que eu compreenda algo de nós, ou de mim?
No último pouco mais de ano e meio, desde a última vez que nos vimos, nunca imaginei uma cena dessas, sem mágoa. Toda vez que tua imagem vinha à memória, era com raiva, com vontade de estapear. Mas nos sonhos que tenho tido, não há raiva. Só amor. Por quê?
Fiquei pensando que a tua relação comigo é diferente da minha contigo. A minha foi e sempre será amor. Mesmo que por algum momento eu tenha sentido raiva. E talvez tu quisesse que eu te odiasse, para que encerrássemos, assim, a nossa história. A tua comigo é de amor e ódio. Tu sabes e tens lembranças do mal que te fiz, na nossa última vida. E talvez é como se me amasses, mas não quisesses. Porque te fiz mal. Ou que me amasses e, ao mesmo tempo, sentisses raivas, pois lembras do que eu fiz. Será que um dia vou ser perdoada pelo passado? Será que a vida toda eu vou te amar?
A frase do André Gorz tem sido usada por mim em meu processo de criação. Há anos que quero fazer um espetáculo sobre amor. Agora, estou criando com minhas alunas do quarto semestre: (DEZ/DES) Amores. São 10 cenas de amor ou de desamor. Será que existe desamor? Ou são amores interrompidos? Ontem criamos uma destas cenas, a partir de fragmentos de discursos amorosos - sim, usei Roland Barthes, mas também outros textos, como Carta a D., O sofrimento do jovem Werther e O silêncio dos amantes. Falar de amor, agora, está me aproximando de ti? Não sei... 
Sigo tentando compreender o incompreendido... Até quando vou sonhar contigo? O que estes sonhos querem dizer? Se a tua presença não está me fazendo mal, isso é bom. Lembras uma vez que ficamos anos sem nos falar e quando tu me ligaste eu te disse: não me fazes mais mal. Talvez não me faças mais...




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