O tempero da vida


Hoje eu falei de ti. Às vezes me pego falando em ti. Contei a uma pessoa que tu me ensinaste o tempero da vida. Introduziste-me ao azeite, ao alho poro, às ervas. Lembrei-me de como a minha vida era “sem sal” até te conhecer. Ou melhor, até conviver contigo, pois já te conhecia.
Hoje eu vi uma foto tua, feliz. Toda vez que eu te vejo, dá um misto de inveja e alegria. Fico feliz em te ver feliz. Mas dói-me pensar o quanto fui imatura e não soube conviver contigo. Com 20 poucos anos, com pouca experiência, é normal que sejamos imaturos. E tenhamos pressa. Eu queria tudo para ontem. E como não via que pudesses me dar, deixei-te. E sofri. Lembro-me o quanto sofri. Lembro-me aquela dor dilacerante no peito. Lembro-me como se fosse hoje, eu dizendo-te para ir embora, chamando-te de egoísta. Nunca te falei tudo o que sentia, nem nunca te falei todos os motivos que me fizeram te deixar. Contei-te alguns, mas talvez não o principal.
Os momentos mais felizes, a dois, eu tive contigo. Éramos leves. Deste-me as cores, as que eu uso hoje. Quando uso o colar que tu me deste e vejo o quanto gosto dele hoje, lembro-me de que, quando ganhei, não o achava bonito. É preciso tempo para amadurecer...
Quando vejo o presente, na certeza de que não conquistei o que fez eu me separar de ti, penso que, então, não devia nunca ter te deixado.
Hoje eu te vi chamá-la como eu gostaria de ter sido chamada. E pensei que, talvez sendo mais nova do que eu, ela tenha tido mais maturidade para estar ao teu lado. Ou foste tu que mudou? Fico feliz em te ver feliz. Sim, é verdade.
Fizemos as escolhas que devíamos, ou podíamos, à época. E, se hoje a minha vida tem cor, és tu o culpado.
Faz cinco anos que trocamos a última correspondência mais íntima – falávamos de nossas vidas, separadas. Depois disso, nunca mais fomos amigos ou confidentes. Tornamo-nos conhecidos. Acompanho-te de longe e torço por ti. Não sei se me acompanhas.
Naquela época, em que nos falamos mais intimamente pela última vez, eu havia assistido a um filme que nunca terminei. Por que será? Hoje eu tive coragem de vê-lo até o fim... E chorei, copiosamente.
Fiquei pensando se tu eras a pimenta, que sempre pensei, ou se no fundo eras o sal. E, porque pensei em ti e vi o filme, pensei em nós: canela, sal e pimenta. Qual de vocês dois era o que? Eu nunca soube. Um tempero eu tirei de minha vida; o outro, não quis entrar (ou ficar).
Queria tanto encontrar-te de novo, em outra pessoa, agora que eu tenho as cores e sei manejar os temperos; agora que eu não tenho pressa. Queria aquele sabor, aquele colorido e aquela leveza de volta. Foi o momento mais feliz de minha vida. Queria dançar de novo como naquela época. Queria um futuro com o sabor daquele passado.
Eu sei que o passado não volta. Só queria aquela sensação de novo. Não contigo. Queria voltar ao tempo... à sensação daquele tempo, agora com minha maturidade. Queria ter sabido fazer as escolhas certas...
O que teria sido de nossas vidas, se as escolhas fossem outras? Não sei. Só sei que contigo fui feliz e leve, mas sentia-me incompleta. Mas o que é a incompletude? Talvez nunca nos sintamos completos.
Hoje eu falei de ti. E tenho certeza de que outras vezes o farei. Tu és uma doce lembrança. E pensei no dia em que tu não estiveres mais aqui... e doeu-me.
Mas para que sofrer antecipadamente? Quero que sejas feliz até o último de seus dias. E mantenha-se alegre e leve. E colorido!
De minha parte, acompanha-te de longe. E tento reproduzir um pouco de ti em mim. 

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