Ficaram as canções

Eu dirigia e eis que começou a tocar uma canção que invariavelmente me levou até a ti. Lembrei-me do nosso reencontro desencontrado. De repente, estávamos nós dois ali e, mais uma vez, tu não pediste para eu ficar. Quantas vezes quis te pedir para me levar contigo? Quantas vezes quis que disseste-me: fica.

Lembrei-me daquele nosso reencontro desencontrado, em que queria que me levasses contigo, pois acreditava que uma vida nova começaria a partir daquele agora. Depois de tanto tempo daquele reencontro, que eu pensei ser derradeiro, me pego pensando nele. Me pego lembrando daquela sensação de que a vida podia acabar a qualquer momento, de que precisava desesperadamente estar contigo. Porque eu via a vida vindo ao meu encontro e via o que o amanhã seria... Não, eu apenas desejava, pois tinha o sol guiando o meu caminho a me levar para longe de ti.

Lembrei-me de um tempo em que qualquer canção me levava a ti. Aquela, que ouvi enquanto dirigia, era só mais uma de tantas que me embalaram naquele verão do reencontro. Como teriam sido nossas vidas, se tivéssemos seguido aquelas canções?

Passaram-se tantos anos depois daquele verão e eu nunca entendi porque nos reencontramos. Nunca entendi porque nos reencontramos se não era para estarmos juntos, até hoje. Nunca entendi porque nos reencontramos para nos desencontrarmos... Passaram-se tantos anos depois daquela primavera, em que nos conhecemos. Passaram-se anos, décadas, e tu ainda me vens à lembrança como o amor não vivido. Passou-se tanto tempo e eu ainda me pego lendo um poema e pensando em ti. E querendo presenteá-lo com o poema.

Fiquei a pensar nas outras canções que me embalaram naquela época. Nas canções cujos versos queria ter escrito pra ti. Ficaram as canções, só não ficou você... Ficaram as canções contigo. Todas. Invariavelmente, quando ouço-as, lembro de ti. E são tantas, durante tantos anos...

Lembrei-me de quando cantarolaste: “Vou desligar, não me ligue mais, a obrigação da tua voz era estar aqui.” Mas o que fizeste para que eu estivesse aí? Nada. Lembrei-me que me disseste, também cantarolando, anos mais tarde, naquele reencontro desencontrado, de que tinhas a força bruta das palavras ditas para amar. E que no fundo, talvez soubesse, que tinhas as senhas para me reconquistar. Mas não quiseste...

Naquele verão, eu cantarolava alto, aos domingos, enquanto tomava meu mate, que tu podias pedir para eu te seguir, pois estava preparada. Cantava com os pulmões a pleno para ver se de lá, longe, tu ouvias aí. Como eu queria que tu tivesses ouvido. Mas um dia, disseste-me que não tinhas este direito: o de me pedir. O que teria sido da minha vida se tivesse largado tudo, como eu queria – e tu sentias – naquela época? Segui sem entender, então, porque nos reencontramos. Porque tu sabias que tinhas norte sobre o fio da espada e achavas que tinhas cada dia a me esperar.

Durante muito tempo, quando nutríamos um amor maldito, as canções eram nosso meio de comunicação. Depois, nos afastamos, nos reencontramos, nos desencontramos, nos quebramos e nos afastamos novamente, mesmo que fisicamente próximos. Algo se quebrou naquele encontro desencontrado e nesse tempo todo, entre palavras não ditas, tantas palavras de amor. Mas o tempo não me afastou de ti. E, ao mesmo tempo, o tempo nunca passou...

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