O mate doce no chimarrão amargo

Não lembro a primeira vez que te vi. Era muito pequenina. Mas minha lembrança é de sempre gostar de ti. Como se tivéssemos sido feitas uma para a outra.


Das memórias da infância, várias vezes estava agarrada a ti. Quando chegavas, a vida virava uma festa. Sentava-me no teu colo e te admirava. Tu, então, me davas o mate para sorver, na tua cuia de prata. Colocavas açúcar para adoçar a minha vida. Mas eu gostava era do chimarrão amargo. Não reclamava, sorvia-o para te agradar.

Balançavas-me no teu colo. Perguntava se eu era do outro time. E eu mentia, para te agradar. Minha vida era uma festa contigo e, para retribuir a alegria, eu te agradava...

Estava sempre agarrada a ti. Para que comer o bolo de aniversário, se o teu colo era mais gostoso? Para que a vida lá fora, se o teu colo era tão aconchegante?

De repente, eu não cabia mais no teu colo e apenas te abraçava. Depois, eu te encobria. Mas tu ainda me cuidavas...

Lembro-me de todos os momentos presentes. De tudo o que vivemos juntas. E, lembro, com dor, dos momentos ausentes. De tuas ausências. De minhas ausências. Tu não estavas na hora da despedida. Assim como eu não estive. Mas a minha perda foi maior que a tua.

Lembro-me o tempo todo daquele abraço e daquele colo. Por anos procurei em outros corpos aquele afeto, o teu amor, o teu toque, o teu olhar cândido. É como se tu soubesses, sempre, do que eu necessitava. E o que eu apenas queria era estar contigo.

Nos separamos, mas estávamos sempre juntas, mesmo em pensamento. Mas tu não me esperaste. Eu contava os dias para te reencontrar. Mas não me esperaste. E, isso, até hoje, eu não perdôo. Nem a mim, nem a ti.

Lembro-me então, das palavras ao telefone, e das lágrimas que escorriam. Nunca mais te veria. E de que adiantava, agora, a contagem regressiva, se tu não me esperaste? Se tu não estarias lá?

A partir daquele dia, nunca mais teria teu colo, mesmo que em outros corpos. Não seguraria mais a tua mão, não tomaria mais o teu mate, não mais te acariciaria. Tu, simplesmente, não me esperaste... E, te foste, levando o mate doce e deixando na minha boca o gosto amargo do chimarrão.

Comentários

Nádia Baldi disse…
Também lembro daquele mate doce... e tb de quem nos "salvou" de uma mamadeira com sal quando éramos pequeninas... Talvez tenhamos as mesmas lembranças e as mesmas saudades...
Alguém que, apesar de laço algum e tão pouco obrigação alguma, sempre esteve presente com seu carinho e, para mim, era a mais "vó" de todas! Lindo texto! Beijo!!!

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